Análise ao novo Regulamento do Fogo Técnico

Por: Emanuel Oliveira Após uma atenta análise ao novo Regulamento do Fogo Técnico, segundo o Despacho n.º 7511/2014 homologado pelo Se...

Por: Emanuel Oliveira

Após uma atenta análise ao novo Regulamento do Fogo Técnico, segundo o Despacho n.º 7511/2014 homologado pelo Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, o qual altera o Despacho n.º 30/90, de 15 de maio, do Presidente da Autoridade Florestal Nacional, homologado e publicado em anexo ao Despacho n.º 14031/2009, de 22 de junho, podem-se constatar grandes alterações. Obviamente, todavia não é possível determinar e avaliar ainda o seu real impacto.


O certo é que à partida vai no sentido oposto a uma das recomendações definidas pela Resolução da Assembleia da República n.º 51/2014, publicada no passado dia 12 de Junho de 2014 em Diário da República a que recomendava ao Governo entre diversas medidas:
«2.1 — Concentrar numa única entidade a coordenação operacional de prevenção e de combate aos incêndios florestais, mantendo o planeamento na responsabilidade das entidades que atualmente a detêm;».

Isto porque o actual Regulamento do Fogo Técnico separa as competências do uso do fogo! Por um lado temos o ICNF no âmbito do fogo controlado, por outro lado temos a ANPC no âmbito do fogo de supressão.
Acção de Fogo Controlado
A questão que agora se levanta é: Será que a ANPC passará a ter competências na área florestal, nomeadamente na prevenção? Desviando-se Portugal do caminho seguido pelos demais países da Europa no que concerne ao combate florestal, tal como já foi referido no anterior artigo.

Fazendo nós a analogia relativamente a um incêndio numa embarcação em pleno mar, acaso não é a Marinha a única entidade competente para a supressão do fogo e salvamento dos tripulantes e bens? Então porque é a Marinha e não a ANPC ou outro organismo a proceder ao socorro e à supressão? A resposta é bem simples: porque conhece e domina o meio! 

Então porque na Floresta tem sido tudo tão diferente?

O certo é que temos assistido a uma perda de várias competências do organismo que a detinha há mais de um século – os Serviços Florestais do Estado. Para quem não sabe ou não se recorda os Serviços Florestais detinham:

  1. a gestão florestal (contudo hoje fala-se na delegação de competências para o sector privado);
  2. as acções de prevenção estrutural (hoje partilhadas com as autarquias e organizações de produtores florestais);
  3. o combate aos incêndios florestais (hoje na competência da ANPC);
  4. a fiscalização e policiamento (o Corpo da Guarda Florestal encontra-se há vários anos integrado na GNR);
  5.  a vigilância e a coordenação dos postos de vigia (hoje na competência da GNR e já se fala na transferência para os municípios);
  6. e agora o uso do fogo técnico (competência partilhada com a ANPC). 

E, avaliando pelos resultados que ano após ano se verificam, parece-nos que essas sucessivas transferências de competências não se materializaram na desejada concretização dos objectivos pré-estabelecidos, diluindo-se comodamente as responsabilidades pelo maior número possível de estruturas e organismos. Mas isto é outra conversa, analisemos pois o novo Regulamento do Fogo Técnico.

As duas grandes novidades deste novo Regulamento encontram-se precisamente no:

  • Ponto 2 do Artigo 18.º que estabelece que a credenciação de técnicos em fogo de supressão passa a ser competência da ANPC.
  • Artigo 25.º que estabelece a figura (bem-vinda) do Operacional de Queima.

No entanto, lembramos que a legislação portuguesa é rica em abrir excepções e aqui surge mais uma excepção - ponto 6 do Artigo 18.º, em minha opinião pessoal é positiva se a reduzirmos à função exclusiva de operacional de fogo de supressão, para a qual não é necessário ser um licenciado para executar uma acção de supressão com recurso ao fogo. A excepção estabelece que para além da experiência e do preenchimento de 5 relatórios de incêndios e da formação obrigatória, o operacional deverá deter a “formação de base de nível 5 ou superior, definidos no QNQ”, ou seja a qualificação de nível pós-secundário não superior com créditos para o prosseguimento de estudos de nível superior (12º Ano e CET - Curso de Especialização Tecnológica), conforme Portaria nº 782/2009, de 23 de Julho.
Acção de Formação em Fogo de Supressão
Todavia esta nova versão falha rotundamente por não obrigar ao Técnico de Supressão à prática de um mínimo de horas de fogo controlado no período prévio a cada nova campanha de incêndios florestais. A realização de acções de fogo controlado constituem a melhor escola para o conhecimento do comportamento do fogo e dos factores que o influenciam e o necessário conhecimento do território de “jogo”. O uso do fogo de supressão, dada a variabilidade dos factores que determinam o ambiente de fogo, não pode ser assumido nem encarado da mesma forma como “quem anda de bicicleta e que nunca mais esquece”!

Contudo, vale a pena recordar que a função de Analista de Incêndios, cujo papel é de extrema importância para a definição de uma estratégia de combate com recurso a tecnologias sofisticadas e de interpretação e avaliação dos factores que determinam o ambiente e comportamento do fogo, carece de formação específica quer ao nível científico quer de experiência prática em fogos controlados. Logo, não devem ser confundidas as funções do Técnico de Supressão com o Analista de Incêndios. Ambos são essenciais no Teatro de Operações e trabalham em conjunto. O Analista de Incêndios também poderá garantir as funções de observador (Look Out) e de segurança, dada a informação com que trabalha e trata para fornecer ao COS, no apoio à tomada de decisão.

No que respeita ao Operacional de Queima é sem dúvida alguma uma vantagem no TO contar com operacionais que independentemente das suas habilitações académicas, detenham formação específica e experiência. Por mais simples que pareça, este elemento é de elevada importância para o sucesso das operações com fogo, quer no fogo controlado quer no fogo de supressão. Normalmente, comparativamente a outros países a este elemento dá-se-lhe a designação de Técnico de Ignição (ou seja, é o “homem do pinga-lume”). Contudo, relembro a mesma falha por não exigir a prática de um mínimo de horas de fogo controlado no período prévio a cada nova campanha de incêndios florestais.

Por último, com a nova redacção e a consequente separação de competências em função do uso do fogo técnico, constata-se a extinção do GAUF – Grupo de Análise e Uso do Fogo (no âmbito estrutural conforme hoje conhecemos)!

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