Por: Emanuel Oliveira A prescrição no uso do fogo é como a prescrição médica. Fazendo a analogia entre ambas, o técnico à semelhança do ...
Por: Emanuel Oliveira
O fogo prescrito, sendo um fogo que procura reproduzir um fogo de origem natural, funciona como uma vacina para uma paisagem com um sistema imunitário cada mais debilitado (pelo despovoamento, pelo envelhecimento da população, pela perda de usos do solo), com elevada carga de combustível disponível e vulnerável no quadro das mudanças climáticas. Obviamente que existem outros tratamentos, tais como a roça de matos, seja ela moto-manual ou mecânica, ou mesmo tratamentos mais invasivos como os químicos. Eu prefiro, um programa de “vacinação” dada a sua eficácia e eficiência, porém dependendo das condições do nosso “paciente”. Entenda-se por isso que o Programa Nacional de Fogo Controlado promovido pelo Estado Português, através do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas é um importante programa nacional de vacinação para as nossas paisagens.
Figura 1 - The Grass Fire, Frederic Remington 1908, Amon Carter Museum, Fort Worth, Texas |
Então, qual a prescrição mais adequada para o uso do fogo no tratamento das nossas paisagens?
Cada caso é um caso! Não podemos fazer prescrições transversais em paisagens diversificadas ou em subunidades paisagísticas ou igual para todos os ecossistemas e biomas. Antes de usar o fogo, temos que responder previamente a algumas questões:
- Porque vamos usar o fogo num determinado espaço? Para quê? Para quem?
- Quando vamos usar o fogo?
- Como vamos usar o fogo?
- O que esperar após o fogo?
Existe alguma confusão quanto à prescrição. É comum sobrevalorizar a prescrição meteorológica a qual permite manter o fogo sob determinadas condições de controlo e apoiada em recursos humanos e meios – isto é, mais fogo controlado do que fogo prescrito! Como já referi no artigo anterior, não simpatizo com o conceito de fogo controlado quando se trata de fogo prescrito, pelas razões já enfatizadas.
Figura 2 - As condições de prescrição a observar no uso do fogo prescrito |
Prescrição Ecológica – considerando os ecossistemas e sua recuperação pós-fogo, de acordo com o estado fenológico dos complexos de combustível. Igualmente, devem ser consideradas as condições edafológicas, pois o solo é o suporte de vida dos ecossistemas.
Prescrição Socioeconómica – considerando as necessidades das populações locais, tais como renovação de pastagens ou a cinegética. No caso da renovação das pastagens, a queima deve ter em conta o tipo de gado a as formações vegetais que constituem o alimento deste, pois a técnica, o consumo pelo fogo e estação do ano são importantes para obter os melhores resultados de acordo com as necessidade de cada espécie pecuária (bovinos, ovinos, caprinos e equinos) ou cinegética (coelhos, perdizes, corços, etc.).
Prescrição Técnica – a técnica e método de ignição e condução da queima são essenciais no alcance dos objetivos, procurando reduzir os impactes do fogo no solo e a redução da carga de combustível. Por exemplo, em solos mais pobres e esqueléticos, devemos optar por um fogo rápido, isto é, com um menor tempo de residência, ainda que aparentemente se manifeste como um fogo de alta intensidade, porém o impacte no solo é baixo. Por outro lado, no caso de proteção de zonas de interface ou de outros objetivos de defesa da floresta contra incêndios, é preferível uma efetiva redução da carga de combustível, pelo que o fogo deverá cumprir um objetivo de elevado consumo nas formações vegetais, logo mais tempo de residência.
Figura 3 - Apesar da aparente intensidade do fogo, o curto tempo de residência permite um baixo impacte no suporte dos ecossistemas - o solo |
Prescrição Estacional – a prescrição estacional está relacionada com a prescrição, socioeconómica e sanitária, pois a época em que usamos o fogo determinará os resultados pretendidos.
Quanto à Prescrição Meteorológica esta é importante para estimar a disponibilidade dos combustíveis em relação ao fogo, para reduzir os impactes, para o controlo da propagação, redução de riscos de piroescape, segurança e para os trabalhos de consolidação da queima.
Figura 4 - O fogo quando é mal entendido é visto como o fim da vida, no entanto a Natureza insiste em mostrar-nos a sua necessidade. |
O fogo antes de ser entendido pelo comum cidadão, deve ser bem entendido por todos nós, técnicos que usamos o fogo prescrito!
COMMENTS