Reflexão sobre a Metodologia da Carta de Perigosidade de Incêndio

Artigo desenvolvido por:  Emanuel Oliveira A elaboração da cartografia de risco espacial de incêndio florestal é atualmente uma ferrame...

Artigo desenvolvido por: 
Emanuel Oliveira

A elaboração da cartografia de risco espacial de incêndio florestal é atualmente uma ferramenta essencial na hora de planificar ações de prevenção de incêndios florestais, cujo objetivo é formalizar a identificação de zonas de perigo e risco a uma escala compatível com o ordenamento do território.

Em Portugal, o mapa de perigosidade para além de constituir um instrumento de apoio à planificação, assume um papel condicionador no âmbito do ordenamento do território, salientando o condicionamento de novas edificações no espaço rural e florestal.
Mapa 1 - Mapa de Perigosidade de Incêndio Florestal (Metodologia:AFN/ICNF)

Sendo assim, a cartografia de risco espacial permite identificar os espaços que reúnem condições favoráveis para a ocorrência de incêndios florestais e identificar as zonas mais vulneráveis.

Conhecendo-se o risco, temos a possibilidade de localizar e executar infraestruturas de prevenção e defesa como acessos, corta-fogos, faixas de gestão de combustível, torres de vigilância, pontos de água, bem como dirigir as ações de sensibilização, vigilância e fiscalização, procurando deste modo aumentar a eficiência de todas as medidas.

Com o fim de ampliar a discussão sobre a metodologia aplicada em Portugal para a elaboração do mapa de perigosidade (o qual tem sido amplamente questionado, principalmente pelos técnicos responsáveis pelo urbanismo e ordenamento do território), vou apresentar aqui algumas reflexões, bem como apresentar uma outra metodologia aplicada no território de Espanha.

Com estas duas produções cartográficas pretende-se compará-las e identificar aquela que se aproxima mais da realidade do território no que respeita ao perigo de incêndio, ou seja a “probabilidade que um fenómeno físico, potencialmente danoso” como o fogo “de origem natural ou induzido pela ação humana, se apresente num local específico, com uma certa intensidade num período e frequência”. (Varnes, 1984)

A metodologia para a elaboração do mapa de perigosidade (modelo adotado em Portugal) resulta do produto da probabilidade e da suscetibilidade. A probabilidade é estimada a partir da cartografia de áreas ardidas e a suscetibilidade a partir do declive e da carta de ocupação de solos (por ex.º Corine Land Cover ou a COS produzida pela Direção Geral do Território).

Como este mapa é uma condicionante no âmbito dos planos municipais de ordenamento, muitas vezes limitando as novas construções, a sua metodologia e aplicabilidade tem estado envolta em angustiantes discussões técnicas e políticas.

O mapa de perigosidade é fundamental e tem sido um instrumento importante, principalmente por permitir identificar zonas de interface urbano-florestal mais vulneráveis. No entanto, o problema reside sobre as bases cartográficas utilizadas e aqui podemos destacar essencialmente o seguinte:
  1. A falta de rigor dos perímetros das áreas ardidas mais antigas, principalmente entre 1990 e 2004, obtidos a partir de observações de satélites e aparecendo os perímetros pixelizados (podendo ultrapassar os 300 metros), o que numa escala de planeamento municipal (1: 10 000), traduz-se em complicações na hora de tomada de decisão técnica e política.
  2. A utilização da carta de ocupação do solo em vez da carta de modelos de combustível, com a agravante das classes de suscetibilidade atribuídas a cada nível de ocupação, por exemplo a atribuição do valor máximo a zonas maioritariamente cobertas por afloramentos rochosos ou a galerias ripícolas, o que incrementa o valor final de perigosidade. 
Analisando a metodologia para a elaboração do mapa de perigosidade concluímos que o principal objetivo é definir um zonamento para limitar o surgimento de novas edificações e a preocupação reside sobretudo nas zonas de interface. Contudo, este foco orientado ao ordenamento e urbanismo conduz a que este zonamento não tenha aplicabilidade real na definição de medidas e ações que visem a prevenção dos incêndios florestais e a redução dos efeitos da propagação do fogo, pois o mapa de perigosidade apenas evita que se construa em locais que no mapa surgem dentro das classes alta e muito alta perigosidade (cujos valores são incrementados pela metodologia aplicada).
Mapa 2 - Mapa de Risco de Ignição de Incêndio Florestal
Se observarmos a metodologia aplicada em Espanha, esta tem em conta os fatores espaciais que são determinantes na ignição e na propagação do fogo. O mapa de risco de ignição tem em consideração a exposição/insolação, os modelos de combustível, a proximidade dos aglomerados urbanos e da rede viária. Quanto ao mapa de risco de propagação, o modelo procura reproduzir como o fogo vai propagar-se tendo em conta as características do ambiente, tais como: o declive, os modelos de combustível e a exposição/insolação.

Cabe ainda salientar que os valores atribuídos aos modelos de combustível são diferentes para cada mapa, pois cada modelo apresenta valores diferentes para a ignição e para a propagação, por exemplo uma zona de pinhal apresenta um valor mais reduzido na ignição (valor 2) mas máximo na propagação (valor 5).
Mapa 3 - Mapa de Risco de Propagação de Incêndio Florestal
A soma de ambos mapas (ignição e propagação) dá origem à carta de risco de incêndio florestal e, assim, identificamos os espaços mais suscetíveis de ocorrência e vulneráveis.
Mapa 4 - Mapa de Risco de Incêndio Florestal (Ignição + Propagação)
Se em ambos mapas finais sobrepusermos as ignições ocorridas entre 2010 e 2013 (obtidas maioritariamente a partir de GPS/SIRESP), podemos constatar que no mapa de perigosidade incidem sobre zonas de muito baixa e baixa perigosidade, mas no mapa de risco incidem sobre zonas de alto e muito alto risco. Este resultado permite-nos perceber que o fator humano refletido nas vias de acesso e nos núcleos urbanos, bem como os modelos de combustível e a topografia são determinantes no risco de incêndio, independentemente da probabilidade baseada na área ardida. Assim, através deste modelo baseado na ignição e propagação, podemos definir ações estruturais mas também ações de sensibilização e de vigilância nas zonas identificadas de maior risco.
Mapa 5 - Localização das Ignições entre 2010-2013 (GPS) sobre o Mapa de Perigosidade
Mapa 6 - Localização das Ignições entre 2010-2013 (GPS) sobre o Mapa de Risco de Incêndio (Ignição + Propagação)
CONCLUSÕES

Na 3ª Geração de Planos Municipais de Defesa da Floresta Contra Incêndios dever-se-á manter o mapa de perigosidade, revendo-se a metodologia e integrando obrigatoriamente a carta de modelos de combustível.

Igualmente, torna-se fundamental considerar a inclusão dos mapas de ignição e de propagação.

Todavia, dever-se-ia ponderar a integração da probabilidade de ocorrências tendo em conta os históricos, mas excluindo todas as ocorrências baseadas em geolocalização toponímica, ou seja apenas incluindo as ignições georreferenciadas mediante recurso GPS, com o fim de evitar erros grosseiros.

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Reflexão sobre a Metodologia da Carta de Perigosidade de Incêndio
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